Os muitos Brasis de Dira

Entrevista

Praticamente não há estado brasileiro que Dira Paes desconheça. Com mais de 40 filmes no currículo, a atriz paraense, que recebe este ano o troféu Oscarito do Festival de Cinema de Gramado por sua contribuição à produção audiovisual brasileira, talvez conheça o Rio Grande do Sul até melhor do que muitos gaúchos. “Somente em ‘Anahy de Las Misiones’, estive em uma caravana cinematográfica que foi de Uruguaiana a Caçapava do Sul. O cinema me levou para o mundo e fez com que eu conhecesse e compreendesse um Brasil gigante e plural”, conta a homenageada.

Aliás, essa é uma das tônicas de sua carreira: nas dezenas de papeis que já interpretou, Dira procurou conhecer as brasileiras dos diversos ‘Brasis’ que existem dentro do próprio Brasil, o que ajudou a moldar muito mais do que a sua trajetória profissional como uma das mais queridas intérpretes do Brasil. “Comecei a atuar aos 15 anos de idade, seguindo a mera intuição de uma jovem que queria abandonar a ideia da engenharia para ser atriz. Ao longo desse tempo – e por ser muito jovem também – o cinema ajudou a me criar: além de me dar uma carreira, teve papel fundamental na formação da minha personalidade”, afirma Dira.

Fôlego eclético

Hoje com 33 anos de carreira, ela ostenta um currículo de dar inveja: da comédia ao drama, passando por filmes populares e autorais, além de obras infantis (a sua mais recente descoberta), Dira trabalhou com importantes nomes da cinematografia nacional como Walter Lima Jr., Helvécio Ratton, Cláudio Assis, Breno Silveira e uma outra infinidade de nomes que a homenageada cita com entusiasmo. A carreira eclética, no entanto, não surgiu por acaso. “Eu sempre busquei essa multiplicidade. Atuar é um voo cego, você não sabe o que vai encontrar pela frente, mas acho que tenho essa disponibilidade de entender qual a vertente de um trabalho e segui-la, sem impor nada. Sou uma atriz que gosta de ser dirigida e tem prazer em ser colocada diante de desafios. Esse fluxo criativo que os personagens me oferecem é algo que sempre me apaixona”, revela.

Foi justamente a ânsia por papeis interessantes e desafiadores que fez Dira, em 2004, migrar também para a TV, onde estreou no papel da inesquecível Solineuza no seriado “A Diarista”. “Fui para a TV porque começaram a me oferecer bons papeis. E não tenho do que reclamar até agora: nesse curto espaço fazendo carreira na TV, sempre encontro nas ruas pessoas que citam meus personagens, e isso é um verdadeiro presente”, comemora.

A ida para a TV, por outro lado, jamais distanciou Dira da tela grande. Pelo contrário. Inclusive, foi no ano da estreia de “A Diarista” que ela viveu um dos momentos mais marcantes de sua carreira: entre 2004 e 2005, voltou novamente ao Rio Grande do Sul para gravar “Meu Tio Matou Um Cara”, de Jorge Furtado, e ainda lançou “Mulheres do Brasil” e “2 Filhos de Francisco”, que, na época, chegou a ultrapassar “Carandiru” como o filme de maior bilheteria da chamada retomada do cinema nacional. “Foi quando percebi que eu realmente tinha fôlego para aquilo tudo”, recorda a homenageada.

E que fôlego: dessa temporada em diante, vinte novos personagens ganharam vida nas mãos de Dira, uma estatística que, entre tantas outras, jamais se converte em qualquer tipo de fardo para a paraense. “Não sinto todo esse currículo nas minhas costas porque os personagens que interpretei não me pertencem. Eles são do cinema e do público brasileiro. É até clichê falar isso, mas a sensação é de um eterno recomeçar, de que sempre tem um novo filme ou um novo desafio pela frente”, avalia. Sobre o que está por vir, Dira aponta que seu coração busca projetos mais desarmados e autorais, onde possa ser surpreendida pelos talentos de um cinema brasileiro que, conforme observou ao longo dos últimos 33 anos, hoje estabeleceu um padrão de qualidade muito consolidado.

Uma observadora de si mesma

Já de viagem agendada para o Festival de Cinema de Gramado, Dira preserva um carinho muito especial pela cidade serrana. “Gramado me lembra cinema e também o público saudando os atores nas ruas. Todo mundo que faz cinema tem o maior orgulho de ganhar o Kikito, um prêmio que ecoa por todo o Brasil”, conta a atriz, que já teve seu trabalho consagrado duas vezes na Serra Gaúcha: em 2003, como melhor atriz coadjuvante, pelo longa “Noite de São João”, e em 2011, como melhor atriz, pelo curta “Ribeirinhos do Asfalto”.

Sobre a homenagem, ela diz que qualquer reconhecimento de Gramado vem sempre carregado de uma emoção muito grande, mas que o momento oferece a oportunidade de virar uma observadora de si mesma. “Além da honra e do orgulho, uma homenagem como essa traz um olhar de fora para dentro, onde você se olha, se revisita, se reavalia. É a oportunidade de observar tudo o que vivi e também de reforçar meus laços com o futuro, já que ainda pretendo viver muitas transformações através dos meus personagens”, projeta.

Dira Paes recebe o troféu Oscarito dia 25 de agosto no Palácio dos Festivais.

(Texto: Matheus Pannebecker / Pauta – Conexão e Conteúdo)

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